XIV Domingo do Tempo Comum - Ano B

14º DOMINGO DO TEMPO COMUM (ANO B)

5 de Julho de 2016

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos (Mc 6, 1-6)

1Naquele tempo, Jesus foi para a sua terra e os discípulos seguiam-no. 2Chegado o sábado, começou a ensinar na sinagoga. Os numerosos ouvintes enchiam-se de espanto e diziam: «De onde é que isto lhe vem e que sabedoria é esta que lhe foi dada? Como se operam tão grandes milagres por suas mãos? 3Não é Ele o carpinteiro, o filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? E as suas irmãs não estão aqui entre nós?» E isto parecia-lhes escandaloso. 4Jesus disse-lhes: «Um profeta só é desprezado na sua pátria, entre os seus parentes e em sua casa.» 5E não pôde fazer ali milagre algum. Apenas curou alguns enfermos, impondo-lhes as mãos. 6 Estava admirado com a falta de fé daquela gente.

Chave de leitura

Neste 14º Domingo do Tempo Comum, a Igreja coloca à nossa consideração a rejeição de Jesus por parte das pessoas de Nazaré. A sua passagem por Nazaré foi dolorosa. A que era a sua comunidade agora já não o é. Algo mudou. Os que antes o acolhiam, agora rejeitam-no. Como veremos depois, esta experiência de rejeição levou Jesus a tomar uma decisão e a mudar o seu agir. Desde que começaste a participar na comunidade algo mudou na tua relação com a família e os amigos? A participação na comunidade serviu-te para acolher e ter mais confiança nas pessoas, sobretudo nos mais humildes e nos mais pobres?

O contexto de ontem e de hoje

Ao longo das páginas do seu evangelho, Marcos indica que a presença e a acção de Jesus constituem uma fonte crescente de alegria para alguns e um motivo de rejeição para outros. Cresce o conflito, aparece o mistério de Deus que envolve a pessoa de Jesus. Com o capítulo 6º, encontramo-nos na narração diante de uma espécie de curva. As pessoas de Nazaré fecham-se perante Jesus (Mc 6, 1-6). E Jesus, perante esta postura de fechamento das pessoas da sua comunidade, abre-se às de outras comunidades. Dirige-se às pessoas da Galileia e envia os seus discípulos em missão, ensinando como deve ser a relação com as pessoas, de modo que seja verdadeira relação comunitária, que não exclua, como acontece com as pessoas de Nazaré (Mc 6, 7-13). Quando Marcos escreve o seu evangelho, as comunidades cristãs viviam uma situação difícil e sem horizontes. Humanamente falando não havia futuro para elas. A descrição do conflito que Jesus vive em Nazaré e o envio dos discípulos, que alarga a missão, torna-as criativas. Para os que crêem em Jesus não se pode estar numa situação sem horizontes.

Comentário do texto

Marcos 6, 1-3: reacção das pessoas de Nazaré perante Jesus. É sempre bom regressar à nossa terra. Depois de uma larga ausência, também Jesus regressa e, como de costume, no dia de sábado vai a uma reunião da comunidade. Jesus não era o coordenador, mas apesar disto tomou a palavra, sinal de que as pessoas podiam participar e expressar a sua opinião. Mas as pessoas não gostaram do que Jesus disse e ficaram escandalizadas. Jesus, conhecido por elas desde criança, como tinha mudado tanto? As pessoas de Cafarnaum aceitaram o ensinamento de Jesus (Mc 1, 22) mas as de Nazaré ficaram escandalizadas e não o aceitaram. Qual a razão da recusa? “Não é este o carpinteiro, o filho de Maria?”. Não aceitavam o mistério de Deus presente numa pessoa tão comum como elas. Para poder falar de Deus deveria ser diferente delas! O acolhimento dado a Jesus não foi bom. As pessoas que deveriam ser as primeiras a aceitar a Boa Nova, são precisamente as primeiras a não a aceitar. O conflito não é só, portanto, com os de fora, mas também com os parentes e com as gentes de Nazaré. Eles não aceitam porque não conseguem entender o mistério que envolve a pessoa de Jesus. “De onde é que isto lhe vem e que sabedoria é esta que lhe foi dada? Como se operam tão grandes milagres por suas mãos? Não é Ele o carpinteiro, o filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? E as suas irmãs não estão aqui entre nós?”. E não conseguem acreditar.

A expressão “irmãos de Jesus” causa muita polémica entre católicos e protestantes. Baseando-se neste e noutros textos, os protestantes dizem que Jesus teve muitos irmãos e irmãs e que Maria teve mais filhos. Nós, os católicos, dizemos que Maria não teve outros filhos. O que pensar de tudo isto? Em primeiro lugar, quer as posições dos católicos quer as dos protestantes, retiram o argumento da Bíblia e da antiga Tradição das respectivas Igrejas. Por isso não convém discutir estas questões com argumentos racionais, fruto das nossas ideias. Trata-se de convicções profundas, que têm a ver com a fé e o sentimento das pessoas. O argumento sustentado só por ideias não consegue desfazer uma convicção da fé que encontra as suas raízes no coração. Só irrita e desassossega. Mas ainda que não se esteja de acordo com a opinião do outro, devo contudo respeitá-la. Em segundo lugar, em vez de discutir sobre os textos, todos nós, católicos e protestantes, devemos unir-nos muito mais na luta em defesa da vida, criada por Deus, vida tão ultrajada pela pobreza, a injustiça, pela falta de fé. Devemos recordar outras frases de Jesus: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10, 10); “para que todos sejam um, para que o mundo acredite que tu me enviaste” (Jo 17, 21); “Não o proibais. Quem não está contra nós, está connosco” (Mc 9, 39-40).

Marcos 6, 4-6: Reacção de Jesus perante o comportamento das pessoas de Nazaré. Jesus sabe muito bem que “santos da casa não fazem milagres” e diz: “Um profeta só é desprezado na sua pátria, entre os seus parentes e em sua casa”. Com efeito, onde não há a aceitação da fé, as pessoas não podem fazer nada. O preconceito impede-o. Mesmo querendo, Jesus não pode fazer nada e permanece atónito perante a falta de fé dos seus concidadãos.

Informações acerca do evangelho de Marcos

Este ano litúrgico apresenta-nos de modo particular o evangelho de Marcos. Vale a pena dar algumas informações que nos ajudem a descobrir melhor a mensagem que Marcos nos quer comunicar.

O desenho do rosto de Deus na parede do evangelho de Marcos

Jesus morreu por volta dos 33 anos. Quando Marcos escreve o seu evangelho nos anos setenta, as comunidades cristãs viviam já dispersas pelo Império Romano. Alguns afirmam que Marcos escreveu para as comunidades de Itália. Outros afirmam que foi para as da Síria. É difícil saber com certeza. De qualquer forma, uma coisa é certa: não faltavam os problemas. O Império Romano perseguia os cristãos, a propaganda do Império infiltrava-se nas comunidades, os judeus da Palestina revoltavam-se contra a invasão romana. Existiam tensões internas devidas a diversas tendências, doutrinas, chefes...

Marcos escreve o seu evangelho para ajudar as comunidades a encontrar resposta para estes problemas e preocupações. Recolhe vários episódios e palavras de Jesus e une-os entre si como ladrilhos de uma parede. Os ladrilhos são já antigos e conhecidos. Vêm das comunidades onde foram transmitidos oralmente em reuniões e celebrações. O desenho formado pelos ladrilhos era novo. Vinha de Marcos e da sua experiência acerca de Jesus. Ele queria que as comunidades, lendo o que Jesus fez e disse, encontrassem resposta para estas perguntas: “Quem é Jesus para nós e quem somos nós para Jesus?”; “Como ser discípulo?”; “Como anunciar a Boa Nova de Deus, que nos revelou?”; “Como percorrer o caminho traçado por ele?”.

Três chaves para entender as divisões no evangelho de Marcos

1ª Chave: O evangelho de Marcos foi escrito para ser lido e escutado em comunidade. Quando se lê a sós um livro, pode-se voltar atrás, para unir uma parte com a outra, mas quando se lê em comunidade e uma pessoa está diante de nós a ler o evangelho, não é possível dizer: “Pára! Lê outra vez. Não entendi bem!”. Como veremos, um livro escrito para ser escutado nas celebrações comunitárias tem um modo diverso de dividir o tema relativamente a outro que é lido a sós.

2ª Chave: O evangelho de Marcos é uma narração. Uma narração é como um rio. Atravessando o rio de barco, ninguém se dá conta da divisão das águas. O rio não tem divisões. É constituído por um só fluir, desde o princípio até ao fim. No rio, as divisões fazem-se desde as margens. Diz-se, por exemplo: “Que bela parte do rio a que vai desde aquela casa até à curva onde se encontra a palmeira, que está três curvas depois!”. Mas na água não se vê nenhuma divisão. A narração de Marcos flui como um rio. As suas divisões são encontradas por aqueles que as escutam e as encontram nas margens, como se fosse, nos lugares por onde Jesus passava, na geografia, nas pessoas que encontra, ao longo dos caminhos que percorre. Estas indicações à margem ajudam o leitor a caminhar com Jesus, passo a passo, da Galileia até Jerusalém, do lago até ao Calvário.

3ª Chave: O evangelho de Marcos foi escrito para ser lido de uma só vez. Era assim que faziam os judeus com os livros mais pequenos do Antigo Testamento. Alguns entendidos afirmam que o evangelho de Marcos foi escrito para ser lido, todo inteiro, no decurso da longa vigília da noite de Páscoa. Por isso, a fim de que as pessoas que escutassem não ficassem cansadas, a leitura devia ser dividida e ter algumas pausas. Além disso, quando uma narração é longa, como a do evangelho de Marcos, a sua leitura deve ser interrompida a cada passo. Em certos momentos é necessário fazer uma pausa, doutra forma os ouvintes perdem-se. Estas pausas estavam já previstas pelo próprio autor da narração. E fazia-se entre as leituras longas dando alguns resumos prévios. Praticamente como acontece na televisão. Todos os dias, ao começar a telenovela são repetidas algumas cenas do episódio anterior. Quando termina são apresentadas algumas cenas do dia seguinte. Estes resumos são como os eixos ou articulações que unem o que foi lido com o que vai ser lido. Permitem parar e começar de novo sem interromper nem alterar a sequência da narração. Ajudam os que ouvem a colocar-se no rio da narração que flui. No evangelho de Marcos encontram-se vários resumos deste tipo ou pausas, que permitem descobrir e seguir o fio da Boa Notícia de Deus que Jesus nos revelou e que Marcos nos conta. No total trata-se de sete blocos ou leituras mais longas intercaladas de pequenos resumos ou articulações onde é possível fazer umas pausas.

Uma divisão do evangelho de Marcos

Eis uma possível divisão do evangelho de Marcos. Outros dividem-no doutro modo. A importância de uma divisão é que abra uma das muitas janelas para o interior do texto e nos ajude a descobrir a rota do caminho que Jesus abriu para nós em direcção ao Pai e aos irmãos.

  • Mc 1, 1-13: Começo da Boa Nova.
  • Preparar o anúncio.
  • 1ª Leitura.
  • Mc 1, 14-15: Pausa, resumo, articulação.
  • Mc 1, 16-3, 16: Cresce a Boa Nova.
  • O conflito torna-se presente.
  • 2ª Leitura.
  • Mc 3, 7-12: Pausa, resumo, articulação.
  • Mc 3, 13- 6, 6: Cresce o conflito.
  • Aparece o mistério.
  • 3ª Leitura.
  • Mc 6, 7-13: Pausa, resumo, articulação.
  • Mc 6, 14-8, 21: Cresce o mistério.
  • Não é compreendido.
  • 4ª Leitura.
  • Mc 8, 22-26: Pausa, resumo, articulação.
  • Mc 8, 27-10, 45: Eles continuam sem compreender.
  • A a luz obscura da cruz aparece.
  • 5ª Leitura.
  • Mc 10, 46-52: Pausa, resumo, articulação.
  • Mc 11, 1-13, 32: Cresce a luz obscura da cruz.
  • Aparece a ruptura e a morte.
  • 6ª Leitura.
  • Mc 13, 33-37: Pausa, resumo, articulação.
  • Mc 14, 1-15, 39: Cresce a ruptura e a morte.
  • Aparece a vitória sobre a morte.
  • 7ª Leitura.
  • Mc 15, 40-41: Pausa, resumo, articulação.
  • Mc 15, 42-16, 20: Aumenta a vitória sobre a morte.
  • Reaparece a Boa Nova.
  • 8ª Leitura.
  • Mc 16, 9-20.

Nesta divisão os títulos são importantes. Indicam o caminho do Espírito, da inspiração, que percorre o evangelho desde o princípio até ao fim. Quando um artista tem uma inspiração procura expressá-la através de uma obra de arte. A inspiração é como uma força eléctrica que corre invisível através do fio e acende a lâmpada da nossa casa. Do mesmo modo a inspiração corre invisível através das letras, da poesia ou das formas das pinturas para revelar e acender em nós uma luz semelhante ou quase semelhante à que brilhou na alma do artista. Por isso, as obras artísticas atraem e causam admiração às pessoas. O mesmo sucede quando lemos e meditamos o evangelho de Marcos. O mesmo Espírito ou Inspiração que levou Marcos a escrever o texto, continua a estar presente nas palavras do seu evangelho. Mediante uma leitura atenta e orante, este Espírito entra em acção e começa a actuar em nós. E assim, pouco a pouco, descobrimos o rosto de Deus que se revelou em Jesus e que Marcos nos comunica no seu livro.

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