O Escapulário e a Consagração a Maria
 

NOSSA SENHORA DE FÁTIMA E O ESCAPULÁRIO DO CARMO

(Continuação)

- O Escapulário e a Consagração a Maria -

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A 10 de Dezembro de 1925, no Convento de Tui em Espanha, Nossa Senhora apareceu de novo a Lúcia quando estava a rezar. Revelou-lhe aquilo que chamamos a Grande Promessa. Essa nova aparição deu uma forma definitiva e completa a toda a Mensagem de Fátima, e muito concorreu para promover a devoção universal ao Imaculado Coração de Maria.

 

Lúcia disse-me que Nossa Senhora apareceu numa luz muito brilhante que emanava do seu coração circundado de espinhos e a sangrar continuamente. A seu lado, em pé, estava o Menino Jesus numa nuvem luminosa. Apontando para o coração de sua Mãe Ele dizia à Lúcia: «Tem piedade deste terno coração continuamente ferido pela ingratidão dos homens, e sem ter quem o console com actos de reparação». Falou-me então Nossa Senhora: «Olha, minha filha, o meu coração cercado de espinhos, com que os homens ingratos me atravessam a cada instante pelas suas blasfémias e suas ingratidões. Tu, ao menos, procura consolar-me com a prática dos primeiros sábados do mês». Nossa Senhora nessa ocasião prometeu assistir com graças especiais de salvação na hora da morte, a todos aqueles que no primeiro sábado de 5 meses consecutivos, se confessassem e comungassem, rezassem o terço e passassem na sua companhia um quarto de hora a meditar nos mistérios do Rosário com intenção de oferecer-lhe reparação.

 

A 8 de Dezembro de 1942, na presença de 40.000 pessoas, o Santo Padre consagrou a Igreja e o mundo ao Imaculado Coração de Maria. E, a 11 de Fevereiro de 1950, numa carta comemorativa do VII Centenário do Escapulário, o mesmo Santo Padre pede a todos os Carmelitas do mundo inteiro, quer da Ordem primeira, segunda ou terceira regulares ou seculares, que vejam no Escapulário o sinal da sua consagração ao Imaculado Coração de Maria, a qual com insistência vem recomendando nestes últimos tempos.

 

Estas palavras do Vigário de Cristo, chamam a nossa atenção sobre um aspecto da devoção ao Escapulário do Carmo, que com muita frequência e de modo especial é considerado em nossos dias. A maioria dos católicos desconhece o valor da consagração do Escapulário e considera-o como mero símbolo da devoção a Maria. Entretanto, o Escapulário é um dos mais antigos símbolos de consagração a Nossa  Senhora.

 

Para compreender o Escapulário como o Santo Padre deseja que o consideremos, devemos ter em mente, que ele é o hábito duma Ordem que desde a sua origem foi consagrada a Maria. Os eremitas do Carmelo embebiam-se na contemplação para honrá-La e imitá-La. Ela era para eles a sua Vida, Doçura e Esperança. Foi Ela quem os inspirou a praticar a pureza de corpo e alma que lhes permitia ver e compreender as coisas de Deus. Tão devotados estavam a Ela que aqueles que os conheciam chamavam-nos de Irmãos de Nossa Senhora do Monte Carmelo, título que desde então se tornou oficial. Esse antigo título da Ordem é eloquente! A História do Carmelo assaz prova como foi bem escolhido. O místico Monte Carmelo é possessão de Nossa Senhora, é a herdade da qual Ela é Rainha e Mãe, porém mais Mãe do que Rainha. Os cuidados que Ela prodigalizou ao Carmelo e as solicitudes com que o acompanhou através dos tempos, provam que o Carmelo é d’Ela dum modo especialíssimo.

 

O Carmelo é de Nossa Senhora não por um título meramente externo, mas pelo facto de ser a reprodução do seu espírito. A sua razão de ser é honrá-La, louvá-La e servi-La. Todas as gerações de Carmelitas A proclamaram Bem-aventurada, dum modo peculiar a eles, isto é: duma maneira simples e humilde que nos recorda a vida de Maria em Nazaré.

 

Esta consagração total do Carmelo a Maria é simbolizada pelo hábito. É usando o hábito que alguém se consagra a Maria no Carmelo. O hábito em si mesmo é apenas um pedaço de pano, mas considerado como veste duma Ordem totalmente consagrada a Maria, ele tem um sentido diferente. O hábito nunca deve ser considerado separado da Ordem, ou visto a não ser como um meio de consagração a Maria no seio da Ordem. Jamais alguém se vinculou mais absolutamente a um senhor do que o candidato ao hábito carmelitano a Nossa Senhora do Carmo. Tomar hábito, significa dedicar toda a vida a Maria, consumir-se no serviço de Maria, viver uma vida dedicada absolutamente a Ela, conforme a tradição viva, da qual Ela é o espírito. A vestição do hábito não é uma mera cerimónia exterior. O hábito coloca o fiel no Carmelo, faz dele uma parte viva do seu organismo espiritual, traça um vínculo místico entre o fiel e Nossa Senhora. Quem recebeu o hábito já não é um estrangeiro no Carmelo, mas sim uma parte integrante da grande família universal unida à sua Mãe espiritual pelos mais íntimos laços de amor e devoção filiais.

 

O hábito carmelitano não retira o seu carácter consecrativo da visão de S. Simão Stock, ou do Papa João XXII; muito antes do tempo de S. Simão Stock, já a História tinha fixado o sentido do Escapulário na Igreja. Foi a um hábito já conhecido como seu, que Nossa Senhora anexou as suas promessas. No entanto, a grande promessa da visão do Escapulário de 1251, segundo a qual «quem morrer com o Escapulário não padecerá o fogo eterno», enriqueceu o seu carácter mariano, e reafirmou que a Ordem é de Maria dum modo especial. O Privilégio Sabatino que Ela ordenou ao Papa João XXII que anunciasse ao mundo enriqueceu-o ainda mais, e fez dele não somente um meio de consagração a Ela, mas também um sinal tangível do seu poder e mediação universal. Quem conhece o lugar que Maria Santíssima ocupa no plano da Redenção não ousaria negar o seu poder de unir ao hábito da sua Ordem as suas grandes promessas, porém a razão porque Ela concedeu tão extraordinárias graças é um mistério: mistério do seu especial amor pelo Carmelo.

 

Ainda que os Confrades da Confraria do Escapulário não sejam membros da Ordem, são agregados a ela, e têm o direito de participar dos seus tesouros espirituais de orações e boas obras. O emblema da Confraria é o Escapulário o qual desde a Idade Média simbolizava todo o hábito. E como o hábito tira o seu sentido e finalidade da Ordem, assim também o Escapulário que outra coisa não é senão o hábito numa forma abreviada. O Escapulário agrega-nos numa Ordem totalmente consagrada a Nossa Senhora, ele coloca-nos no Carmelo, une-nos à sua vida íntima de oração e méritos, e dá-nos a protecção do seu místico manto. Os membros da Confraria não estão obrigados a uma regra de vida, como os membros da Ordem Terceira, mas o confrade do Escapulário é também consagrado a Maria. Não seria mister recordar que isso traz como consequência a obrigação de imitá-La. O Escapulário porém, não é o símbolo duma vocação particular, mas duma total consagração ao serviço de Maria no Carmelo.

 

Desta breve análise do sentido do hábito, podemos compreender bem agora porque o Santo Padre insiste para que toda a família carmelitana veja nele um sinal da sua consagração à Virgem Imaculada.

 

Poderia perguntar-se, se a consagração que o hábito carmelitano representa realiza a condição requerida para ganhar a grande promessa feita à Lúcia. Nossa Senhora não recomendou nenhuma forma particular de consagração, mas desde que Ela apareceu como Nossa Senhora do Carmo a segurar nas mãos o Escapulário, pode concluir-se, que ao menos, ela favorece a antiga devoção do Escapulário. Na sua entrevista com o Pe. Raffert, O. Carm., Lúcia insistiu muito que o Escapulário fazia parte da Mensagem de Fátima. Naquela altura, Lúcia tinha lido a carta do Santo Padre a respeito do VII Centenário do Escapulário, e por isso citou-a corroborando assim as suas afirmações.

 

Todo o teor da Grande Promessa feita à Lúcia, recorda-nos as promessas anexas ao Escapulário feitas por Nossa Senhora. De facto, a Mensagem de Fátima com tantas referências ao inferno e ao purgatório e à intercessão de Nossa Senhora está em perfeita consonância com a tradição da devoção do Escapulário.

 

Do que dissemos da consagração a Nossa  Senhora, pode-se ver que não é uma mera forma da qual se esquece brevemente. O que nós prometemos a Maria, por meio do hábito do Carmelo, é toda a nossa vida. Damos tudo o que temos e tudo o que somos para o tempo e para a eternidade. A consagração é uma entrega total de si mesmo que se manifesta em cada pensamento, palavra e acção da nossa vida quotidiana O sentimento duradouro de que pertencemos a Maria é que dá a toda a nossa vida um sentido novo, e converte-a num obséquio amável, íntimo e filial a Ela. O que os Carmelitas sempre dedicaram a Maria foi a sua vida inteira, e a devoção da Ordem a Ela não consiste em exercícios de devoções particulares, mas antes, em servi-La eternamente. A consagração, por outras palavras, deve ser uma força vital e permanente que inclina os corações e a mente a Maria e cria dentro de nós uma atitude de alma que transforma radicalmente as nossas acções.

 

Poderíamos perguntar, se esse sentimento permanente de pertencer e servir a outrém não se opõe àquela independência inerente à nossa personalidade. Pelo contrário: servir Maria é reinar, é cultivar o que há de melhor em nós. O erro fatal do chamado Iluminismo foi pensar que o homem podia achar a perfeição e a integridade da sua personalidade fora de Deus.

 

A consequência foi que o indivíduo nunca se tornou menos pessoa do que actualmente. A máquina veio dominar o homem, e um dos problemas angustiosos da Sociologia dos nossos dias é o de salvar a personalidade humana de desaparecer no meio das organizações técnicas modernas. Dar a própria vida a Deus por meio de Maria, servindo-A, é encontrar a vida e haurir da fonte da verdadeira felicidade humana.

 

O segundo elemento da consagração é a imitação, e é muito bem simbolizado pelo hábito. No sentido bíblico, vestir uma vestidura sugere ornar-se a si mesmo com virtude ou poder. S. Paulo usa a expressão: revestir-se de Cristo, a fim de lembrar a nossa obrigação de ornármo-nos das suas virtudes. Vestir o hábito portanto, significa assumir a responsabilidade de revestir-se das virtudes de Maria e viver a vida espiritual do Carmelo imitando-A. A vida íntima do Carmelita, é o espelho da vida de Maria, e o hábito é um contínuo despertador da nossa obrigação de cultivar esta vida de Maria em nós. Não se trata aqui do que fazemos, mas como o fazemos. Se temos o sentido profundo, de que pertencemos a Maria, tudo o que fazemos é para a sua honra e glória. Parece ser também este o espírito da Mensagem de Fátima; pois Nossa Senhora pediu a mudança do coração e o cumprimento dos deveres do próprio estado de vida. Hoje em dia, principalmente, que a fé está divorciada da vida quotidiana, é importante relembrar que o trabalho é uma oração, e que a fé deveria impregnar toda a vida do cristão.

 

Esta foi sempre a vocação carmelitana. Comentando o modo de vida carmelitana, Fernando Tartaglia expressou-se muito bem ao escrever: «O escopo da família carmelitana é aderir a Deus por uma vida contínua em sua presença, e servi-Lo fielmente com o coração puro e boa consciência em honra de Nossa Senhora e por amor a Ela».

 

A vida é uma luta e consequentemente uma penitência. No plano da Redenção, até os trabalhos ordinários são penitências impostas ao homem decaído. E, se são feitos com verdadeiro espírito de conformidade podem ser oferecidos em reparação dos pecados. Hoje em dia, quando tantos perderam a consciência do pecado, não deixa de ser uma penitência diária, o ser-se fiel aos próprios deveres, e manter a própria vida num nível sobrenatural.

 

Outro elemento essencial duma vida consagrada, é a oração que é a vida da alma. Não importa quais sejam os nossos deveres quotidianos, a oração deverá ser sempre a nossa primeira e mais importante obra. A Mensagem de Fátima pede orações e mais orações por nós mesmos, pelos pecadores, por todo o mundo. Devemos bater e continuar batendo à porta da misericórdia divina, a fim de que Deus, pelos méritos e preces que Lhe oferecemos por meio da sua Santíssima Mãe, abra-nos os tesouros infinitos da sua divina misericórdia.

 

Em Fátima, Nossa Senhora pediu a recitação diária do Rosário. E o Escapulário é um meio ideal da consagração a Ela. O Rosário é a expressão ideal dessa consagração feita em oração.

 

As antigas devoções do Rosário e do Escapulário atravessaram juntamente uma longa e difícil história. E conforme diz Lúcia «o Rosário e o Escapulário são inseparáveis», eles devem portanto permanecer unidos na vida quotidiana do verdadeiro cristão.

 

Uma das condições da Grande Promessa é meditar 15 minutos sobre um mistério do Rosário. Pede Nossa Senhora que meditemos a Palavra de Deus como Ela o fez, a fim de que a luz e o amor inundem as nossas almas. Por 15 minutos de meditação diária Santa Teresa prometeu-nos o céu. E 15 minutos de meditação durante o terço, não é muito para aqueles a quem Maria, a Mãe da vida contemplativa, se dignou chamar seus filhos predilectos. Vestidos com o seu hábito, guiados sempre pela luz do seu exemplo, embalados ao ritmo do Rosário diário, subiremos em paz às alturas do Carmelo.

 

Sendo sábado o dia dedicado a Nossa Senhora do Carmo, a confissão e a comunhão do primeiro sábado de 5 meses consecutivos, não deve ser condição para qualquer membro da família carmelitana.

 

Sem excessivo esforço portanto, todos os Carmelitas podem viver das 3 grandes promessas de Nossa Senhora: a promessa da visão do Escapulário, o Privilégio Sabatino e a Grande Promessa de Fátima.

 Esforcemo-nos portanto, por viver na presença de Deus, vivendo no espírito da nossa total consagração a Maria, a fim de que Ela que é a Mãe do Amor Formoso, da Sabedoria e da Santa Esperança nos mostre o Fruto bendito do seu ventre, e seja o amparo dos nossos passos vacilantes na vereda recta e estreita que conduz à Pátria.

 

Kyliano Lynch, O. Carm.

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