Domingo da Ascensão do Senhor - Ano C

DOMINGO DA ASCENSÃO DO SENHOR (ANO C)

8 de Maio de 2016

 alt

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas (Lc 24, 46-53)

 46Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Assim está escrito que o Messias havia de sofrer e ressuscitar dentre os mortos, ao terceiro dia; 47que havia de ser anunciada, em seu nome, a conversão para o perdão dos pecados a todos os povos, começando por Jerusalém. 48Vós sois as testemunhas destas coisas. 49E Eu vou mandar sobre vós o que meu Pai prometeu. Entretanto, permanecei na cidade até serdes revestidos com a força do Alto.»50Depois, levou-os até junto de Betânia e, erguendo as mãos, abençoou-os.51Enquanto os abençoava, separou-se deles e elevava-se ao Céu.52E eles, depois de se terem prostrado diante dele, voltaram para Jerusalém com grande alegria.53E estavam continuamente no templo a bendizer a Deus.

Chave de leitura

Poucas linhas que falam de vida, de movimento, de caminho, de encontro. Objectivo que cumpre assim está escrito e todos os povos. O caminho é o que é traçado pelo testemunho. Os apóstolos são os enviados, não levam nada de próprio consigo, mas fazem-se vida, movimento, caminho, encontro, caminho que faz florescer a vida a toda a parte que cheguem.

v. 46: Assim está escrito que o Messias havia de sofrer e ressuscitar dentre os mortos, ao terceiro dia.Que está escrito? Onde? A única escritura que conhecemos é a do encontro. Deus parece que não pode fazer nada sem o homem e por isso vai buscá-lo onde se encontre e não se rende até que o abrace. Isto é o que está escrito. Um amor eterno, capaz de abaixar-se no padecer, de beber até ao fim o cálice da dor contanto que veja o rosto do filho amado. Nos abismos da não-vida, Cristo desce para pegar na mão do homem e acompanhá-lo até casa. Três dias. Três momentos: paixão, morte e ressurreição. Isto é o que está escrito. Para Cristo e para todos os que lhe lhe pertencem. Paixão: tu entregas-te com confiança e o outro faz de ti o que quer, abraça-te ou destroça-te, acolhe-te ou rejeita-te... porém tu continuas a amar, até ao fim. Morte: uma vida que não retrocede... morre, acaba, mas não para sempre, porque a morte tem poder sobre a carne, o espírito que vem de Deus regressa a Deus. Ressurreição: tudo é esclarecido e tem sentido à luz da Vida: o amor doado não morre, ressuscita sempre.

v. 47: Que havia de ser anunciada, em seu nome, a conversão para o perdão dos pecados a todos os povos, começando por Jerusalém.A palavra de Jesus pronunciada na história não chegou ao fim. Tem necessidade de anunciadores. E os apóstolos vão, enviados no nome santo de Deus. São enviados a todos os povos. Já não a um povo escolhido, mas a todos os homens. Vão abraçar os seus irmãos para convertê-los e dizer-lhes: tudo te foi perdoado, podes voltar para a vida divina, Jesus morreu e ressuscitou por ti! A fé não é uma invenção. Eu venho de Jerusalém. Vi com os meus olhos, experimentei-o na minha vida. Não te conto outra coisa senão a minha história, uma história de salvação.

v. 48: Vós sois as testemunhas destas coisas. Deus é conhecido pela experiência. Ser testemunha quer dizer levar escrita na pele, cosida, sílaba por sílaba, a palavra que é Cristo. Quando alguém é tocado por Cristo, converte-se numa lâmpada que ilumina e, ainda que não queira, resplandece. E se alguém quisesse apagar a chama, voltaria a acender-se, porque a luz não é da lâmpada, mas do Espírito, derramado no coração que irradia sem fim a comunhão eterna.

v. 49: E Eu vou mandar sobre vós o que meu Pai prometeu. Entretanto, permanecei na cidade até serdes revestidos com a força do Alto. As promessas de Jesus realizam-se. Ele parte mas não deixa órfãos os seus amigos. Sabe que têm necessidade da presença constante de Deus. E Deus volta a vir ao homem. Desta vez já não na carne, mas invisivelmente no fogo do amor impalpável, no ardor de um vínculo que jamais se romperá, o arco-íris da aliança ratificada, o esplendor do sorriso de Deus, o Espírito Santo. Revestidos de Cristo, revestidos do Espírito os apóstolos já não terão medo e poderão finalmente partir.

v. 50: Depois, levou-os até junto de Betânia e, erguendo as mãos, abençoou-os. O momento de deixá-los é solene. Betânia é o lugar da amizade. Jesus levanta as mãos e abençoa os seus. Um gesto de saudação que é um dom. Deus não se afasta dos seus, simplesmente deixa-os para voltar de forma diferente.

v. 51: Enquanto os abençoava, separou-se deles e elevava-se ao Céu. Toda a separação comporta desagrado. Neste caso a bênção é um legado de graça. Os apóstolos vivem uma comunhão tão grande com o seu Senhor que não se dão conta da separação.

v. 52:E eles, depois de se terem prostrado diante dele, voltaram para Jerusalém com grande alegria. A alegria dos apóstolos, alegria de ir pelas ruas de Jerusalém com um tesouro sem medida, o tesouro da pertença. A humanidade de Cristo entra no céu, é uma porta que se abre para já não mais fechar-se. A alegria da vida superabundante que Cristo derramou na experiência deles não desaparecerá jamais.

v. 53: E estavam continuamente no templo a bendizer a Deus. Estar... um verbo importantíssimo para o cristão. Estar supõe uma força particular, a capacidade de não fugir das situações mas de as viver até ao fim. Estar. Um programa evangélico para entregar a todos. Então o louvor aparece sincero, porque no estar, a vontade de Deus aparece como a bebida saudável e inebriante de felicidade.

Reflexão

O testemunho da caridade na vida eclesial é sem dúvida o espelho mais claro para a evangelização. É o elemento que limpa o terreno para que quando a semente da Palavra for semeada dê fruto abundante. A boa notícia não pode escolher outros caminhos para chegar ao coração dos homens senão os caminhos do amor recíproco, uma experiência que conduz directamente até à fonte: “Este é o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei!” (Jo 15, 12). Tudo isto encontra-se comprovado na Igreja primitiva: “Por isto conhecemos o amor: Ele deu a sua vida por nós; portanto também nós devemos dar a vida pelos irmãos” (1Jo 3, 16). O discípulo que encontrou e conheceu Jesus, o discípulo amado, sabe que não pode falar senão d'Ele e não percorrer senão os caminhos que Ele percorreu: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6). Que melhores palavras para dizer que o caminho fundamental de toda a evangelização é o amor gratuito? Cristo é o caminho para evangelizar. Cristo é a verdade para anunciar na evangelização. Cristo é a vida evangelizada. E é evangelização o amor com que nos amou, um amor entregue sem condições, que não retrocede, mas que avança até ao fim, fiel a si mesmo, à custa da morte na cruz da maldição, para mostrar o rosto do Pai como rosto de Amor, um Amor que respeita a liberdade do homem, ainda que isto signifique rejeição, desprezo, agressão, morte. “A caridade cristã tem em si mesma uma grande força evangelizadora. Na medida em que sabe fazer-se sinal e transparência do amor de Deus, abre a mente e o coração ao anúncio da Palavra da verdade. Como dizia Paulo VI, o homem de hoje desejoso de autenticidade e de concretude, aprecia mais os testemunhos do que os mestres e em geral só depois de ter conseguido o sinal palpável da caridade é que se deixa guiar para descobrir a profundidade e as exigências do amor de Deus (CEI, Evangelizzanione e testimonianza della caritá, em Enchiridion CEI, vol. 1-5, EDB, Bologna, 1996, nº 24). Motivar e sustentar a abertura aos outros no serviço é dever de toda a acção pastoral que pretenda realçar a relação profunda existente entre fé e caridade à luz do evangelho, e aquela nota característica do amor cristão que é a proximidade e o cuidado pelos outros (cf. Lc 10, 34).

Palavra para o caminho. Actualização

Crer na Ascensão de Jesus é crer que a humanidade de Cristo, da qual todos participamos, entrou na vida íntima de Deus de um modo novo e definitivo. Jesus ocultou-se em Deus, porém não para ausentar-se de nós, mas para viver, a partir desse Deus, uma proximidade nova e insuperável, e impulsionar a vida dos homens para seu destino último.

Isto significa que o ser humano encontrou, em Deus, um lugar para sempre. “O céu não é um lugar que está acima das estrelas, é algo muito mais importante: é o lugar que qualquer pessoa tem junto a Deus”. Isso quer dizer que nos dirigimos para o céu, entramos no céu, na medida em que orientamos a nossa vida para Jesus e nos adentramos nele.

Deus tem para os homens um espaço de felicidade definitiva que Cristo nos abriu para sempre. Uma pátria última de reconciliação e de paz para a humanidade. Isto que será escutado por muitos com um sorriso céptico, somos seres alegremente estranhos (para essas pessoas), mas levamos em nós uma fé que nos oferece razões para viver e esperança para morrer.